quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

A Minha Geração é a Mais Colorada de Todas. E Sempre Será.

Nasci em 1979. Entrei na pré-escola em 1985. Formei-me na faculdade de Administração em 2005.


Se você, caro leitor, é um Colorado de verdade e pertence à minha geração, o parágrafo acima é autoexplicativo. Por si só ele já justifica o título deste post.  Se você preferir, nem precisa continuar lendo, uma vez que nada do que vier na sequência lhe representa algo que já não seja sabido.

Mas, no caso de você ou não ser Colorado, ou nem gaúcho, ou nem gostar de futebol, tenho certeza de que, ao final deste artigo, entenderá o que quero dizer.  O mesmo pode ser dito aos Colorados de gerações anteriores ou posteriores à minha. Para estes, o texto que, devido ao título, pode inicialmente parecer ter ares pretenciosos ou até mesmo de arrogância, ficará claro e plenamente compreensível ao seu final. Não se trata de uma afronta, mas de licença poética.

Antes de tudo, é bom esclarecer que sou um cara que gosta muito de futebol. Não acompanho apenas jogos do Inter, vejo praticamente tudo o que passa na TV a respeito. Quanto ao meu time do coração, me considero exatamente isso: um Colorado de coração, mas sem ser fanático ao extremo.  Sempre torço até um limite que eu considere saudável, afinal, a vida tem outras coisas a serem priorizadas. Sou sócio em dia, só compro produtos licenciados, compro o uniforme oficial todo ano, vou ao estádio de vez em quando e tenho as minhas “mandingas” e superstições, como todo torcedor. Jamais briguei por causa de futebol. Guardo as frustrações para mim e sempre respeito os outros. Até acho que sou comedido demais em flautear os adversários (em especial, o coirmão tricolor) justamente por ter amigos gremistas que prezo muito mais do que a rivalidade, esta muitas vezes desvirtuada por pessoas (ou seriam bárbaros?) que não conseguem desassociar a palavra “adversário” da palavra “inimigo”.

Dito isso, vamos analisar a argumentação em favor da minha geração.

Meu pai é Colorado. Veio do interior de Santo Antônio da Patrulha (parte onde hoje é o município de Caraá) e chegou a Porto Alegre em 1972. Viveu todo aquele período de conquistas do Inter da década de 1970, com seus grandes times. Esteve no Beira-Rio nas finais daqueles campeonatos. Viu de perto jogadores como Falcão, Manga, Carpegiani, Valdomiro e Cia passearem soberanos pelos gramados daquela época.  Eu nasci em 1979, ano do tri nacional, conquistado de forma invicta, feito até hoje inigualado no campeonato brasileiro. Fato de tamanha relevância que acabou por criar uma das expressões pela qual nós gaúchos somos conhecidos mundo afora: o “tri legal”. Não é todo dia que se vê um título passar a fazer parte de toda uma cultura, mesmo que involuntariamente.

Não lembro de quando nem por que me tornei Colorado. Quando vi, já tinha escolhido torcer pelo Inter.  Talvez por ver meu pai torcendo. Mas, parafraseando um dos filmes-documentários do Inter, acho que é por causa do vermelho. Como é bonito o vermelho!

Ter nascido num ano tão especial certamente seria o prenúncio de que mais feitos relevantes viriam em seguida. Mas não foi bem assim que aconteceu. E o que aconteceu não poderia ter sido pior. Pensem numa criança de 4 anos, recém começando a entender como funcionam as coisas da vida,  iniciando sua “formação futebolística”, amparada por campeonatos nacionais jamais sonhados pelos rivais até então. De repente, ela vê esses rivais ganharem o Brasil, a América e, segundo eles, o Mundo, tudo em poucos meses.  Sem nem sequer saber direito o que é torcer, ela já tem que se esforçar para aguentar as piadas dos tios gremistas (e não eram poucos) e encontrar alguma razão para não torcer pelo tal “Campeão do Mundo”. O que essa criança podia fazer era esperar para que o seu time fizesse o mesmo.  Será que faria?

Veio 1985 e, juntamente com a vida escolar que se iniciava, eu descobria aquela que seria a pior de todas as mazelas em termos de flautas: a que vinha dos colegas de aula. Era a pior porque nunca vinha de apenas uma pessoa. E, muitas vezes, vinha de várias ao mesmo tempo. Era quase insuportável. E ficou ainda mais angustiante. Em 1995 ainda viria outra conquista da América pelo rival, sem falar de outro brasileiro em 1996 e das Copas do Brasil nos anos que se seguiram.

Terminei o segundo grau (hoje ensino médio) técnico em 1997. Dá pra imaginar o que é passar 13 anos da sua vida até então, 13 anos inteiros tendo de conviver sempre com as mesmas flautas e sempre tentando se justificar tendo apenas alguns grenais e uma Copa do Brasil como paliativo, em doses homeopáticas, para comemorar perante os amigos torcedores do rival? Talvez para um adulto, com maturidade suficiente, isso nem seria assim tão complicado, embora não menos doloroso. Mas passar toda a infância e adolescência convivendo com isso era dose. Quase um castigo. Era de chorar em certas ocasiões. Perdi as contas das vezes em que ouvi chamarem meu Inter de “Inter-Regional” ou de entrar em estabelecimentos comerciais que tinham aquela famigerada plaquinha escrito “Fiado só quando o Inter for campeão do mundo”.

Era demais para aguentar. Não tinha como você tentar comparar a grandeza do seu clube apenas baseado no tamanho e amor da torcida perante todas as conquistas internacionais do tradicional adversário, mesmo tendo ciência absoluta e nunca duvidando da tal grandeza. A soberba tomou conta dos tricolores dessa época. Ficaram ainda mais insuportáveis em suas flautas. E com razão, pois nós, Colorados, haja vista o que nossas direções apresentavam em termos de times e gestões, não conseguíamos vislumbrar o dia em que chegaríamos a tais conquistas. Na década de 1970, os gremistas mal sonhavam em ganhar dos times paulistas e cariocas e nós Colorados já éramos campeões brasileiros. Mas o sofrimento dos Colorados das décadas de 80 e 90 era pior, pois as conquistas do arquirrival davam-se em âmbito internacional.

O bom disso tudo era que, mesmo vivendo in loco a época mais difícil para um torcedor do Inter em toda a história, eu jamais, em momento algum, sequer titubeei ou pensei em desistir de ser Colorado. Ao contrário, parecia que a cada título do coirmão eu via aumentar a minha convicção. Eu sabia, tinha certeza de que um dia as coisas iriam mudar. Mas ainda levaria um tempo...

Entrei na faculdade em 1998. Aí eu já era adulto, mas mesmo assim, continuava na mesma situação. E, na faculdade, as flautas vinham mais sofisticadas, em nível universitário, se é que me entende. A era da internet estava recém começando, então a informação era disseminada mais facilmente.  Minha formatura foi em 2005. Isso mesmo, caro leitor. Não bastasse passar os 9 anos do primeiro grau (hoje ensino fundamental) vendo os colegas e amigos gremistas me flautearem dizendo que eram campeões da América e do Mundo (enquanto nós conseguíamos apenas uma Copa do Brasil), não bastasse passar mais 4 anos do segundo grau vendo eles serem campeões brasileiros, da Copa d Brasil e da América mais uma vez, ainda passei mais 7 anos da faculdade ouvindo as mesmas flautas e ainda vendo eles ganharem mais uma Copa do Brasil, em 2001. Resumindo, passei todos os meus 20 anos escolares sem poder comemorar um título relevante e sem poder flautear meus colegas, a não ser por dois rebaixamentos à segunda divisão. E esse tempo não tem mais volta, não terei essa oportunidade novamente.

O ponto chave aqui é: Qualquer outra geração de Colorados anterior à minha não teve de passar por isso.  E as posteriores jamais passarão.

Toda aquela minha “Coloradice” começaria a regozijar-se a partir de 2002. Mesmo sendo um ano difícil, onde o Inter escapara pela segunda vez de um rebaixamento na última rodada do campeonato, este ano marcou o início de uma revolução no clube. Revolução essa que, de lá para cá, fez com que o Inter tenha conquistado uma quantidade de títulos em tão pouco tempo raramente vista no futebol brasileiro. Enquanto os 40% azul do RS levaram 12 anos para ganharem duas Libertadores e um Mundial, o Inter o fez em incríveis 4 anos. E, em 5, já havia acumulado mais duas Recopas, 1 Sulamericana, vários títulos gaúchos e de outros torneios internacionais, ultrapassando o arquirrival neste quesito. Aquilo que era sonho de repente passou a ser realidade. O Inter conseguiu, de 2002 até hoje, janeiro de 2012, ganhar pelo menos um título todo ano. E, desde 2006, pelo menos um título internacional por ano.

Não sei se esse ritmo irá manter-se. É muito difícil. Mas tomara que sim. Também não acredito que o coirmão irá amargar tanto tempo mais sem ganhar nada. Mas tomara que sim. Se bem que 10 anos são nada perto do que nós Colorados passamos. Eles nem têm direito de reclamar. Óbvio que uma criança gremista que hoje tem 10 ou 11 anos não viu seu time ganhar nada de importante, mas tem ao menos o respaldo do que aconteceu no passado. Eu não tinha. Os Colorados das novas gerações terão.

Mas também uma coisa é certa: essa época de vacas magras não mais se repetirá para os lados do Beira-Rio. Primeiro porque agora a conversa é outra. Somos Campeões de Tudo! O único clube do Brasil que detém todos os títulos vigentes possíveis. Segundo porque, com o atual nível de gestão atingido, dificilmente entraremos em uma competição sem termos condições de ganhá-la. O Inter é hoje um clube reconhecido mundialmente, seja pelas conquistas, seja pela referência em gestão. Estamos definitivamente em  um outro patamar. Um que finalmente justifica o nome do clube. Percalços ocorrerão, o que é natural, mas nunca mais seremos os mesmos. Nunca mais Colorado nenhum sofrerá da chaga de não ser campeão do mundo!

Não estou aqui querendo comparar os dois clubes. Trata-se de comparar o Inter com ele mesmo. As menções ao tradicional adversário dão-se porque é preciso, para fins de relatar a história toda e porque a existência e sucesso dos dois estão diretamente interligados, por isso são chamados por muitos de coirmãos.

Quando me refiro à minha geração como sendo a mais Colorada de todas, não pretendo desrespeitar as que passaram ou as que se seguirão. Essa afirmação vem justamente de todas as dificuldades pelas quais ela passou, coisa que nenhuma geração teve de passar. Era preciso ser muito perseverante e corajoso para ser Colorado naquela época e ter orgulho disso. Hoje é muito mais fácil. E continuará sendo mais fácil daqui para adiante, não importa o que aconteça, pois já chegamos lá. Hoje uma criança Colorada pode bater no peito e dizer aos amigos e colegas que seu time já ganhou tudo.

A emoção de poder presenciar tanto aquela época quanto esta que agora passamos também é algo único, um verdadeiro divisor de águas. E isso é que faz a coisa toda ter um sabor ainda mais especial.  Não sei em que época você pode estar lendo esse artigo. Muita coisa pode ter acontecido desde que ele foi escrito, em janeiro de 2012: conquistas, derrotas, ou o que quer que seja. Mas uma coisa é certa: O Inter mudou muito desde a minha época. E para melhor. E assim permanecerá.

Digo que tudo começou a mudar daquele dia 17 de Dezembro de 2006, cuja sensação foi brilhantemente relatada pelo grande Colorado Luis Fernando Veríssimo no vídeo intitulado “Não me Acorde”, narrado por Adroaldo Guerra Filho, outro ilustre Colorado. É um relato que jamais sairá da minha memória. É um daqueles momentos únicos!


Desnecessário mencionar todos os protagonistas daquela conquista, seja o "Capitão Planeta" Fernandão, seja o "Gigante" Iarley ou o predestinado e contestado Adriano Gabiru. Uma vitória maiúscula sobre um supertime de futebol, que possuía o melhor jogador do mundo, que, às vésperas da partida final havia aplicado um estrondoso show de bola sobre um adversário mexicano. Poucas vezes se viu tamanho chocolate. Mas o Inter foi lá e provou que a história não está reservada apenas aos que podem, mas aos que, acima de tudo, querem. O resultado, todos nós sabemos. Não é preciso repetir aqui, a história já se encarregará disso por muitos e muitos anos.

O bom de tudo isso é que pude comemorar todas essas conquistas com meu pai! Eu que, naquele mesmo ano de 2006, depois de perder o Gauchão, reclamava para ele, louco de bravo, dizendo que eu achava que iria morrer sem ver meu time ganhar um título de relevância mundial. Logo naquele ano, que marcaria uma virada histórica poucas vezes vista. E meu pai lá, me dizendo que um dia chegaria a nossa vez.  E chegou!  Eu sempre tive para mim que um filho tem a obrigação de torcer pelo mesmo time que o pai. Hoje isso faz mais sentido do que nunca. Como foi bom esperar! Valeu cada ano, cada derrota, cada angústia. Espero que ainda possamos comemorar muitos outros títulos juntos.

Da esquerda para a direita: Ribas, Desconhecido, Bianquine, Santino (meu pai) e Eu - 17/12/2006

 Se você leu até aqui e, ou não é Colorado, ou nem gaúcho, ou nem gosta de futebol, espero que tenha compreendido o porquê do título do post. Provavelmente ele ficou mais claro agora, não é? Obrigado por acompanhar o texto até aqui.

Se você, mesmo tendo entendido o primeiro parágrafo e não tendo a necessidade de ler o resto, o fez, parabéns! Você o fez porque se interessou, porque se identificou, porque sente o mesmo que eu. Você o fez porque certamente é COLORADO!


Saudações Coloradas!


1 comentários:

  1. Excelente texto!
    Digo isso com a autoridade de quem nasceu em 1980 e passou *exatamente* por tudo isso relatado acima.
    Uma eterna época de vacas-magras, vacas que até certo momento pareciam gordinhas com os Brasileiros da década de 70.
    Hoje o Inter é impulsionado por uma torcida apaixonada, muitos acabaram se tornando exigentes por causa do grande acúmulo de títulos nos últimos anos. Mas acima de tudo uma torcida orgulhosa por torcer para este clube, o INTERNACIONAL, cada vez mais internacional!
    Parabéns pelo texto!

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